domingo, 1 de junho de 2008

As Primeiras Referências sobre o Lendário "Preste João"

As Primeiras Referências sobre o lendário “Preste João”

Supõe-se, que as histórias sobre o reino do “Preste João”, tiveram início na Europa, quando os Cruzados começaram a retornar a suas casas, regressados das campanhas bélicas do Médio Oriente. Como heróis e como guerreiros, para além de estenderem os seus “arrojados” feitos bélicos aos seus atónitos conterrâneos, certamente que lhes contaram também os conhecimentos que tiveram de outras civilizações, de outras culturas e, de outros costumes tão díspares dos seus.

Assim, provavelmente, foram os Cruzados que geraram o mito, quando deram conhecimento aos seus curiosos conterrâneos, que na Cidade Santa encontraram peregrinos das mais variadas regiões do mundo, nomeadamente, peregrinos provenientes dum imenso e fabuloso reino a Oriente, onde não havia pobres, nem tão pouco havia abusos dos nobres, uma vez que naquele distante reino, havia trabalho para todos, e a igualdade era uma realidade que fora instalada por um rei-sacerdote humilde e justo.

Aliás, os Cruzados puderam também ter transmitido uma lenda de origem árabe, sobre a rainha Balkis, a bíblica rainha de Sabá, cujo território se situava no actual Iémen, portanto, logo do outro lado do Mar Vermelho, que atraída pela riqueza e pela sabedoria do rei Salomão, resolveu visitá-lo num certo dia. E dessa visita houve um relacionamento mais íntimo, de que veio a resultar o nascimento dum filho, do qual viriam a descender os reis da antiga Abissínia. Esta lenda, provavelmente foi forjada pelos próprios imperadores da dinastia que se estabeleceu na Abissínia a partir de 1270, a fim de convencerem os seus súbitos da nobreza da sua linhagem. Contudo, o mais importante desta lenda, é que aquela pôde ter chegado à Europa pela boca dos Cruzados e, que por tanto ser contada, acabou por ser distorcida e, até mesmo cristianizada, para melhor se adaptar e moldar à origem mítica do “Preste João”.

Assim, a salomónica ascendência dos reis abissínios, foi transferida para um dos reis magos. Precisamente, para Belchior! Pelo que o lendário "Preste João" passou também a ser apresentado na Europa, como sendo um dos descendentes dos magos que, de acordo com o Evangelho de Mateus, haviam visitado o Cristo-Menino com presentes de ouro, incenso e mirra.
Na lenda que liga o mito do “Preste João” ao mito de Salomão, verificamos ainda que o onírico volta a interferir nas acções humanas. Pois, os magos “do Oriente”, região por excelência “dos sábios astrólogos”, ofereceram os presentes paradigmáticos do “outro” mundo ao Cristo-menino: ouro, incenso e mirra. Presentes que na simbologia da Igreja são sublimes e transcendentes, uma vez que para ela, aqueles representam respectivamente: a realeza, a divindade e a paixão.

Contudo, sobre o mito dos reis Magos, não deixa de ser muito interessante observarmos, que apenas o Apóstolo Mateus descreve o encontro com aqueles reis, embora não lhe tivesse atribuído nomes. E, que por sua vez, os Apóstolos Marcos, João e Lucas nada disseram sobre aqueles reis Magos, pelo que a ausência destes nos Evangelhos sinópticos, não deixa de ser surpreendente. No entanto, mesmo os evangelhos do Apóstolo Mateus difere duma outra tradição, oral, apócrifa, que fora fixada por Marco Polo (1254-1324), o qual, no seu Livro das Maravilhas, para além de confirmar a sua existência, encontra também os seus túmulos e, dá-nos a conhecer os seus nomes - Baltazar, Gaspar e Belchior. Aliás, chega mesmo a identificar a cidade de onde partiram para adorar o menino Jesus. “Sava”, a actual Saveh, situada a cem quilómetros a sudoeste de Teerão. (MARCO POLO. O Livro das Maravilhas, p. 64).

As primeiras referências sobre o lendário “Preste João”, chegaram à Europa no ano de 1145, através da crónica de Oto Babenberger, alemão, bispo de Freising e tio de Frederico I, conhecido por Barba-Ruiva, imperador do Sacro Império Romano-Germânico (1152-1190), a qual, dava conta que Hugo de Gebel, Bispo de Jabala, uma colónia cristã no Líbano, tinha informado o papa Eugénio III (1145-1153) que um reino cristão situado “para lá da Pérsia e da Arménia” travava uma guerra vitoriosa contra o mundo muçulmano.

Ora! Aquela notícia que dava conta dum triunfo cristão sobre o Islão, numa segunda frente de batalha, quando todos os exércitos europeus pareciam fracassar em todas as frentes de combate, foram para os europeus notícias muito reconfortantes e esperançosas.

Todavia, aquelas notícias também deram conta, que aquele rei cristão era copta e, por conseguinte, seria um rei herético, o que para muitos Estados europeus era pouco importante, quando aquele rei preenchia os interesses de muitos desses Estados europeus, uma vez que vencia numa outra frente de batalha o odioso inimigo comum. E, acima de tudo, que contribuía para uma vitória final da verdadeira fé.

Assim, pelas mãos do bispo Oto de Freising, nascia na Europa o mito do “Preste João” e do seu poderoso e maravilhoso reino. No entanto, para a divulgação do mito, este bispo foi muito mais além do que qualquer outra personagem histórica, uma vez que em 1150, deu consistência a este. Já na corte de Frederico I, provavelmente, veio a falsificar uma carta, que pretensamente fora enviada por “Preste João” ao imperador bizantino, Manuel I Comneno (1143-1180), ao papa e ao próprio Frederico I, os três maiores governantes da cristandade de então. A notícia dessa suposta carta que fora remetida por um tal “João, Presbítero, pela Omnipotência Divina e pelo poder de Nosso Senhor Jesus Cristo, Senhor dos Senhores” relatava as maravilhas do seu reino.
Na verdade, pela narração de teor fantástico e utópico, rapidamente o imaginário se espalhou por toda a Europa. Aliás, há conhecimento, que até ao século XV, foram feitas desta pretensa carta do “Preste João” várias traduções e muitas cópias destas. E todas as diferentes versões, descreviam as maravilhas daquele lendário reino, o que a tornou muito conhecida no mundo cristão, e de tal maneira, que Ronald Latham diz na sua introdução às Viagens de Marco Pólo, que "graças a esta carta todo o europeu viajante no Oriente procurava o reino do Preste João”.

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